A decisão da Organização dos Países Exportadores de Petróleo mais a Rússia, conhecida como Opep+, de reduzir a produção de petróleo em 2 milhões de barris por dia teve dois efeitos. Um deles, imediato, sobre os preços da commodity. Imediatamente após o anúncio, que confirmou as expectativas mais pessimistas do mercado, o preço do petróleo voltou ao nível de US$ 93 por barril.
O outro, a mais longo prazo, foi sobre os juros americanos. Ontem (5), a taxa dos títulos do Tesouro americano de dois anos, mais sensível às decisões de política monetária, subiu sete pontos-base (centésimos de ponto percentual) para 4,171% ao ano. A taxa dos títulos de 10 anos, que são referência no mercado, subiu mais ainda. Avançou 16 pontos-base, para 3,779% ao ano.
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Os juros dos papéis longos permanecem abaixo das taxas dos títulos mais curtos. Esse fenômeno, conhecido como inversão da curva de juros, mostra que o mercado financeiro está prevendo uma inflação mais elevada no curto prazo.
Juros e inflação
Desde março deste ano, o Fed (o banco central americano) vem elevando os juros para conter a inflação. No caso dos Estados Unidos, o que vem pressionando os índices de preços são a escassez de mão-de-obra e os preços elevados dos combustíveis.
O mercado de trabalho segue apertado, mas essas limitações são mais fáceis de resolver. A expectativa é que mais americanos voltem a procurar empregos após terem resolvido se aposentar ou tentar novas carreiras durante a pandemia.
Os combustíveis, porém, continuam sendo um problema. Os preços do petróleo explodiram e chegaram a US$ 120 dólares nos primeiros dias da invasão russa à Ucrânia. A causa foram temores do mercado de interrupção do fornecimento russo. Porém, vários países liberaram seus estoques estratégicos de petróleo durante o segundo e o terceiro trimestre, o que reduziu os preços. No fim de setembro, o barril de petróleo chegou a ser negociado a US$ 85, nível em linha com as cotações anteriores à guerra na Ucrânia.
Isso levou à atuação da Opep+. Com o corte na produção, os preços dos combustíveis nos Estados Unidos deverão voltar a subir e seguir pressionando bastante a inflação. Isso deverá obrigar o Fed a elevar os juros acima do teto previsto de 4,4% ao ano no primeiro semestre de 2023. E, pior que isso, os juros americanos poderão permanecer elevados por mais tempo do que o previsto pelos investidores. A perspectiva era de uma normalização das taxas já no início de 2024. Isso pode ser adiado em até 12 meses, na avaliação dos analistas.
Impactos no mercado
Juros altos nos Estados Unidos afetam o mercado financeiro como um todo. Eles elevam a rentabilidade dos títulos de renda fixa americanos, tanto públicos quanto privados. Isso piora o desempenho das empresas e derruba os preços das ações. Mais do que isso, torna o ambiente mais adverso para empreendedores, sejam da economia tradicional, sejam das startups tecnológicas.
O aumento da remuneração dos títulos do Tesouro americano, que são o principal porto seguro para investidores temerosos, faz o dólar se apreciar frente às demais moedas, o real brasileiro entre elas. Com isso, os preços da cesta básica denominados em dólar, como os principais alimentos, ficam mais caros em todo o mundo. Isso eleva os índices de preços mais ainda. Fazendo uma comparação mecânica: os preços do petróleo são um excelente combustível para acelerar os motores da inflação global.
Xadrez geopolítico
Há bons motivos para acredita que a solução vai demorar. A decisão da Opep+ tem várias implicações geopolíticas. Pela primeira vez desde o início da pandemia, a medida foi tomada após uma reunião presencial dos diretores dos países-membros da Organização. O encontro foi realizado na sede da Opep em Viena, com a presença de todos os dirigentes, inclusive o vice-primeiro-ministro russo, Alexander Novak.
Foi Novak quem costurou a Opep+ em 2016, aproximando a Rússia do cartel formado por países árabes e africanos. Não por acaso, ele é considerado um dos maiores inimigos dos Estados Unidos. Está sujeito a sanções por Washington, não pode entrar em território americano e é um dos principais assessores do presidente russo Vladimir Putin para formular a estratégia de manter os preços do petróleo elevados para gerar muitos dólares para a Rússia.
Na reunião, os países-membros da Opep+ concordaram no corte de 2 milhões de barris por dia na produção, o que representa 1,5% de redução na oferta global. Isso ocorre em um mercado estruturalmente apertado. Desde o início da década passada, a redução dos investimentos em prospecção e exploração fez com que quase todos os países-membros da Opep tenham produzido menos do que o combinado. Isso os coloca em uma posição de força para negociar preços, algo que será aproveitado pelo governo de Vladimir Putin para enfraquecer as sanções impostas à Rússia por Estados Unidos e União Europeia.
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