CEO da BeFly conta como comprou a Flytour: “A gente só cresce”

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Foto: Victor Affaro/Forbes Brasil

Marcelo Cohen, CEO da BeFly e atual protagonista do mercado de turismo brasileiro

Em 1963, o engenheiro David Cohen “trouxe ao mundo” a Belvitur, agência de turismo que se transformaria na maior de Minas Gerais. Sete anos depois, tornou-se pai de Marcelo, garoto que logo mostraria a mesma paixão por viajar e conectar pessoas às belezas do planeta.

Trabalhando na empresa do pai desde os 17 anos, Marcelo herdou dele a austeridade – e é hoje o protagonista da retomada do turismo brasileiro pós-Covid.

A principal estratégia dos Cohen foi manter a Belvitur (da qual Marcelo assumiu a presidência em 2020) capitalizada nos bons e principalmente nos maus momentos – como na pandemia, que feriu de morte uma infinidade de empresas do setor. Eles chegaram a pensar em sair do mercado. Mas, com o bolso cheio e os concorrentes com pouco poder de barganha, decidiram ir às compras.

E compraram como nunca – cerca de 30 aquisições, incluindo a icônica Flytour, que antes do lockdown era oito vezes maior que a Belvitur (faturamentos de R$ 6,2 bilhões e R$ 800 milhões, respectivamente, em 2019).

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A compra de 100% da Flytour por R$ 500 milhões em outubro de 2021 deu origem à nova gigante Befly, terceira maior agência de viagens da América Latina (atrás da Decolar e da CVC, ambas de capital aberto) e com perspectiva de faturar R$ 10 bilhões em 2023.

“A gente sempre aproveitou as crises para fazer investimentos”, conta Marcelo. “Na hora da bonança, a gente segurava a empresa do jeito que estava e capitalizava. Nas horas de crise, a gente investia porque acabava sendo um investimento mais barato – com mais risco, claro, mas mais barato.”

“Mas desta vez, na pandemia, ficamos em uma grande dúvida: sair ou investir de vez? Decidimos investir e fizemos várias aquisições. Startups, tecnologia focada para o turismo, a Flytour, depois a Queensberry, que é de alto luxo, a QualiTours, focada em cruzeiro marítimo… Criamos um ecossistema chamado BeFly que tem mais de 30 empresas conectadas, com um cross-selling entre elas, uma venda cruzada excepcional”, continua o empresário. “Essa é a beleza do nosso negócio. Hoje, temos uma força de venda que fatura R$ 800 milhões por mês.”

Leia a seguir os principais trechos da entrevista com Marcelo Cohen, CEO da holding BeFly:

Forbes – A grande pergunta que o mercado do turismo brasileiro fez (e que você tem que responder até agora) foi esta: como uma empresa relativamente pequena como a Belvitur conseguiu comprar outra bem maior, como a Flytour?

Marcelo Cohen – Primeiro, a gente entrou na pandemia extremamente capitalizado. Segundo, por causa dela os ativos viraram pó de uma hora para outra. Nós mesmos faturávamos R$ 60, R$
70 milhões por mês, e de repente caímos para R$ 5 milhões. Quem faturava R$ 500 milhões caiu para R$ 10 milhões. As dívidas das empresas do setor ficaram altíssimas.

Quando optamos pelas aquisições, tivemos a ajuda do Banco Master como advisor – eles nos ajudavam a fazer a negociação com os bancos e com os colaboradores, de modo que a gente sabia exatamente onde estava pisando e quanto dinheiro seria necessário para manter o fôlego de cada negócio. Efetivamos a compra da Flytour em outubro de 2021. Em maio deste ano, nós fechamos em R$ 800 milhões de faturamento.

Ou seja, nosso timing foi perfeito, bem na virada da curva. Tem mérito nosso, tivemos coragem, mas também tem o fator sorte. Todos esses fatores andam lado a lado para o sucesso da nossa empreitada.

Em relação ao patamar pré-pandemia, qual é sua expectativa?

O setor vai superar. Nós já superamos: em 2019, nosso recorde histórico era de R$ 560 milhões;
em 2022, chegamos a R$ 800 milhões por mês.

Isso não seria passageiro, em consequência do represamento provocado pela própria pandemia?

Tem o efeito represa, tem o tíquete médio (que está mais alto), tem nossa maior eficiência (a gente nunca ganhou tantas contas – a cada dez concorrências, temos ganhado seis; antes, a cada dez que a Flytour participava, por exemplo, ganhava duas). Ainda estamos 30% abaixo de 2019 em número de faturas – então sabemos que temos essa margem para crescer.

Para que lado deve ir a maior fatia do mercado: turismo corporativo, de lazer, de estudos?

Todos estão crescendo, e nós atendemos a todos os nichos – desde a Vai Voando, que é uma rede de franquias que está em 300 favelas, até a Queensberry, onde eu tenho tíquetes de R$ 100 mil, R$ 150 mil, para o público AAA. Também somos fortes no segmento corporativo, que é nosso carro-chefe, e na parte consolidadora, na qual vendemos bilhetes aéreos para agências de viagem de menor porte – são quase 5 mil agências comprando passagens aéreas conosco. Tudo isso perfaz um volume de vendas mensais de R$ 800 milhões.

O que mudou e o que não mudou no comportamento do consumidor?

Quando apareceu a oportunidade de comprar a Flytour [especializada no segmento de viagens corporativas], fui conversar com algumas pessoas desse mercado, pessoas esclarecidas, disruptivas. Todas me desaconselharam a comprar, dizendo que “o corporativo não volta mais” e que tudo seria substituído por Zoom, Teams, Google Meet…

A Flytour representa a American Express lá fora, e o próprio pessoal da American Express achava que talvez o movimento voltasse apenas em 2024, 2025, 2026. Mas meu feeling (com zero de pesquisa) me dizia que, assim que a pandemia passasse, a viagem de negócios voltaria com os níveis máximos. Acertei. Todas as empresas que tinham parado de voar voltaram a viajar igual louco.

Porque uma coisa é eu fazer uma entrevista com você via Teams ou via Zoom e outra coisa é eu fazer uma entrevista com você olho no olho, como estamos fazendo agora. Ou uma reunião de amigos: em vez de saírem juntos, bater papo e tomar um bom vinho, vocês conversarem por videoconferência. Isso pode ser legal na primeira, na segunda vez. Na terceira você não aparece. No mundo dos negócios é a mesma coisa.

Alguns analistas diziam que o turismo de luxo seria o primeiro a retomar a normalidade.

Ele voltou também. Por causa da alta demanda, um hotel que custava 500 euros está 1.500 euros
a diária. Os preços vão continuar mais altos até a procura cair e as companhias aéreas baixarem o preço. Enquanto isso, o viajante da classe A troca 20 dias na Europa por 15 dias, troca a classe executiva pela econômica, troca o hotel de cinco estrelas por um de quatro – mas não está deixando de viajar.

E ainda existem aqueles que podem bancar uma experiência personalizada, como andar de skate com Bob Burnquist, jogar uma partida de tênis com o Djokovic… Já montamos uma volta ao mundo para um cliente que tinha vendido a empresa e decidiu fazer uma viagem de seis meses. O roteiro custou quase US$ 4 milhões só a parte terrestre, porque o avião era dele.

E qual foi a sua melhor viagem?

Adoro Londres, Paris, Miami, Nova York… Mas a melhor foi um safári na África cinco anos atrás, com a família [a mulher e duas filhas]. Lembro também da primeira viagem internacional: aos 9 anos de idade para a Disney, com meus pais. Fiquei encantado.

Qual foi seu maior susto nesses anos todos na estrada?

Do ponto de vista empresarial, não teve susto maior que a pandemia. Outro foi quando um casal de 70 e poucos anos estava indo para Roma ver o Papa e o homem não queria comprar o seguro saúde de jeito nenhum, dizendo que não tinha problemas de saúde, que não precisava.

Eu estava passando pela mesa da vendedora, ouvi a conversa e resolvi dar o seguro de presente para ele. No terceiro dia em Roma, ele sofreu um infarto. Felizmente recuperou-se e ficou eternamente grato – a conta do hospital ficou em 130 mil euros, e o seguro cobriu tudo.

Mesmo com esse susto da pandemia, você foi às compras. Esse movimento de aquisições vai continuar?

Algumas outras aquisições estão no nosso cronograma, em diferentes segmentos: intercâmbio, plataformas online, tecnologia…

Não tem medo de que alguma startup disruptiva ameace seu negócio? Alguns futurologistas incluem agências de turismo nas “profissões sem futuro”.

Não vejo nada que ameace o nosso negócio. Estamos em todos os nichos, usando tecnologia de ponta… Faz 30 anos que dizem que agência de viagem vai sumir, e faz 30 anos que a gente só cresce.

Você pode fazer tudo pela internet, mas se tiver algum problema para resolver, a quem vai recorrer? Por isso muitos clientes acabam voltando para nós. E muita gente acha que na internet é mais barato, mas na internet é sempre mais caro que em uma agência de viagens.

Vocês têm quantas agências?

Temos 15 lojas físicas, 72 franquias da Flytour e 300 franquias da Vai Voando. Agora estamos criando a BeFly Travel, uma loja multimarcas na qual eu vendo, inclusive, os meus concorrentes para as classes A e B com foco em lazer. Vamos montar 500 lojas franqueadas.

Você citou tecnologia de ponta. Nesse aspecto, qual é a iniciativa mais impactante do grupo?

Temos uma empresa de inteligência artificial que desenvolveu uma assistente virtual para vender pacotes online sem assistência humana. Um vendedor geralmente vende entre R$ 500 mil e R$ 700 mil por mês. Essa vendedora virtual, em três meses de funcionamento, já vendeu sozinha quase R$ 3 milhões. Ela trabalha 24 horas, interage na hora, responde tudo em real time… Tem cliente que faz compras de R$ 120 mil com ela. Eu jamais poderia imaginar uma coisa dessa.

Para não perder o costume, você viaja toda semana para Belo Horizonte, onde sua família mora…

Isso. Fico em São Paulo de segunda a sexta e no fim de semana vou para BH [sua assessora revela que, na volta, ele sempre traz pães de queijo na bagagem].

Reportagem publicada na edição 99, lançada em agosto de 2022.

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