Antes queridinhas dos investidores brasileiros, o trio de ferro do varejo brasileiro – Magazine Luiza (MGLU3), Americanas (AMER3) e Via (VIIA3) – perdeu sua posição no último ano e amarga desvalorizações na casa dos 80% desde que o Copom (Comitê de Política Monetária) iniciou o seu ciclo de aumento da Taxa Selic em março de 2021.
Um dia depois de o comitê aumentar os juros de 2% para 2,75%, as ações do Magazine Luiza começaram uma trajetória de queda. Os papéis saíram de R$ 22,28 para os atuais R$ 4,00 em 18 meses.
Com Via e Americanas o movimento foi similar. Os papéis da Via (dona das marcas Casas Bahia, Ponto e Extra, entre outras) passaram de R$ 11,60 para R$ 3,30 no mesmo período, enquanto Americanas caiu dos R$ 59,70 e foi parar em R$ 13,60 nesse um ano e meio.
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A penalização das ações das varejistas coincide comas mudanças do cenário macroeconômico no período: da mínima de 2% ao ano, os juros foram parar em 13,75% ao ano, enquanto a inflação atingiu uma alta superior a 12% no acumulado de doze meses por vários meses seguidos.
Nos últimos dias, entretanto, a sinalização do Banco Central é de que esses números devem ficar para trás e a reversão das taxas já está no radar.
Isso porque, após a última elevação da taxa de juros para 13,75%, o Copom indicou que pode ter sido a última desse ciclo de altas, ao mesmo tempo em que o principal indicador de inflação do país – o IPCA – registrou o maior recuo desde 1980, de 0,68% em julho.
O resultado desses movimentos foi a volta do trio varejista ao topo dos ganhos do Ibovespa em agosto. Nas últimas três semanas, as ações MGLU3 acumularam 53% de ganhos, enquanto os papéis VIIA3 subiram 36%. Somente Americanas continuou no campo negativo: os papéis acumulam perdas de 4% no período.
A virada começou?
Muito ligadas ao ecommerce e à venda de produtos de linha branca (eletrodomésticos), os negócios do trio Magalu, Via e Americanas estão muito atrelados ao cenário macroeconômico do país. Sendo assim, o primeiro ponto de virada para se mapear é o da inflação e dos juros.
Para André Braz, economista do FGV/Ibre (Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas), a desaceleração dos preços verificada em julho foi muito concentrada nos preços dos combustíveis e da energia elétrica, não foi um movimento visto em outros núcleos importantes, como o de alimentos, remédios e vestuário, que desafogam o bolso da população.
“Excluindo os segmentos de Transportes e Energia, a inflação de julho teria sido mais uma alta, em torno de 0,4%. Para [a queda] ser consistente, precisa ser uma desaceleração generalizada”, diz o economista.
Segundo Braz, em agosto o IPCA ainda será negativo, em torno de 0,3%, pelo mesmo motivo de julho: combustíveis e energia elétrica. Para os próximos meses, o economista indica dois fatores que podem ajudar numa desaceleração dos preços mais generalizada: queda no preço das principais commodities: petróleo, minério de ferro, milho, soja e trigo; e a estabilização dos juros para conter a demanda.
Porém, embora espere melhora nos preços neste segundo semestre, o economista não vê esse quadro como positivo para as varejistas.
“O cenário ainda é de renúncia do consumo. Com o dinheiro escasso e os juros altos, a compra de bens duráveis é postergada. Vale muito mais a pena colocar o dinheiro dessa compra numa aplicação para render do que fazer um dívida”, diz Braz.
Varejistas em xeque
Georgia Jorge, analista do BB Investimentos, compartilha da opinião de André Braz. Para a analista especializada em varejo, o cenário ainda é frágil para essas empresas e requer cautela.
“A perspectiva de redução dos juros no curto prazo e a indicação de uma inflação controlada deu uma impulsionada nas ações, mas é preciso cautela. Não existe nenhuma indicação de que esses dois pontos, se concretizados, irão se reverter em vendas”, diz a analista.
Sobre os juros altos, Jorge aponta dois problemas: aumento das despesas financeiras que consomem o caixa das varejistas e renúncia do consumo pelos clientes. Para aqueles que optam por fazer dívida, ainda há o fator inadimplência.
“Todas essas empresas possuem braços financeiros para conceder crédito aos seus clientes e incentivar as vendas. Mas isso pode resultar em um aumento de provisões para devedores duvidosos e se reverter em mais um problema financeiro”, diz a analista.
Mas nem tudo é negativo. Jorge acredita que a tendência de alta das ações deverá se manter no segundo semestre, em parte ancorada pela perspectiva de vendas em eventos grandes, como a Copa do Mundo (que tradicionalmente impulsiona as vendas de TVs), Black Friday e Natal.
Além disso, a analista sinaliza que tanto Via, quanto Magazine Luiza e Americanas estão fazendo o “dever de casa” e arrumando pontos importantes na operação para navegar ao novo cenário, “o que esperamos que aconteça em meados de 2023”, diz ela.
O que esperar da Magazine Luiza (MGLU3)?
O Magazine Luiza saiu de um lucro líquido de R$ 96 milhões para um prejuízo líquido de R$ 135 milhões no segundo trimestre deste ano. O resultado foi consequência do aumento das despesas financeiras no período e da retração de vendas nas lojas físicas e no ecommerce de estoque próprio.
Para o Goldman Sachs, o ponto alto do resultado do segundo trimestre foi a geração de caixa positiva em R$ 1,3 bilhão. Essa foi a principal “lição de casa” do Magalu, que reduziu os seus níveis de estoque, renegociou com fornecedores e melhorou as margens sem queimar caixa.
“[Esperamos] melhores vendas no segundo semestre, impulsionadas por eventos sazonais e uma base comparativa mais fácil. À medida que a administração se concentra em um ponto de inflexão nas vendas de lojas físicas e do estoque próprio online, e revisita seu estoque de produtos mais sensíveis aos juros, acreditamos que isso poderá apoiar as ações daqui para a frente”, indica o banco norte-americano em relatório.
Sobre pontos de atenção, o Goldman Sachs indica três principais:
investimentos acima do esperado, pressionando negativamente a margem, fluxo de caixa e lucro;
riscos na execução da aceleração do negócio com estoque de terceiros;
custos de logística para acessar regiões de menor densidade, na tentativa de cobrir a concorrência com oferta grátis e subsídios.
A lição de casa da Via (VIIA3)
A Via surpreendeu ao entregar lucro líquido. O número foi modesto, R$ 6 milhões, mas surpreendeu o mercado. Para o Goldman Sachs, o resultado positivo está atrelado à melhora das vendas nas lojas físicas, porém, o banco destaca que o ecommerce deixou a desejar.
A margem da empresa também melhorou – esse era um ponto que preocupava investidores. “O Ebitda ajustado cresceu [na comparação] ano a ano e a margem bruta melhorou, principalmente impulsionada por comissões mais altas no marketplace”, diz relatório do Goldman Sachs.
Porém, o banco norte-americano pondera que o marketplace da Via está desacelerando e esse é o maior desafio da companhia. Para os próximos meses, o Goldman Sachs acredita que a empresa pode se beneficiar dos eventos sazonais, mas vai precisar correr atrás das estratégias online.
Veja os pontos de atenção para a Via:
Taxas de juros devido ao grande impacto nos ganhos com recebíveis e financiamento de vendas;
Frustração no capital de giro devido à volatilidade dos indicadores históricos do ciclo de caixa;
Processos judiciais trabalhistas e suas provisões.
Como ficam as ações das Americanas (AMER3)?
A Americanas decepcionou nas vendas online com estoque próprio e entregou um prejuízo de R$ 98 milhões no segundo trimestre de 2022. Para o Goldman Sachs, o destaque do resultado foram as margens operacionais, que ficaram acima das expectativas, “impulsionadas pela combinação das lojas físicas com o marketplace”.
O banco aponta o desafio da geração de caixa, que permaneceu negativo no trimestre (R$ 1,6 bilhão de queima de caixa ante R$ 1,3 bilhão de queima de caixa no segundo trimestre de 2021). De positivo, as sinergias com a incorporação do negócio físico (Lojas Americanas) com o online (B2W) diminuíram a alavancagem da empresa.
Para os próximos meses, o banco norte-americano espera melhora no volume de vendas e de margem, e acrescenta que o mix de produtos da empresa é melhor do que de seus pares Magalu e Via.
Os pontos de atenção são:
Aumento de custos e de despesas com a entrega de iniciativas de infraestrutura e omnicanal;
Expansão e maturidade mais lenta em novas lojas;
Aumento das despesas associadas à construção da iniciativa de pagamentos Ame Digital;
Riscos de execução em torno de potenciais atividade de fusões e aquisições.
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