Existe um limiar delicado que separa a fome da produção sustentável, se por um lado produzir com sustentabilidade é primordial para o planeta, por outro, o radicalismo ambiental pode levar à insegurança alimentar no mundo.
A crise econômica que atinge o Sri Lanka foi precipitada pela abrupta e desastrosa adoção de agricultura exclusivamente orgânica; o país baniu o uso de fertilizantes químicos e pesticidas, deixando os produtores rurais sem opção de adubação e combate às pragas. O resultado foi uma queda drástica na produtividade e como consequência, uma disparada nos preços dos alimentos e falta de alimentos básicos. O governo se viu obrigado a importar produtos como arroz, cuja produção era autossuficiente com excedente exportável. O mundo todo tem acompanhado consternado a crise que se abateu sobre o país, produtos como leite e farinha estão em falta, enquanto a inflação dos alimentos alcançou 60%. A crise econômica atingiu severamente o setor do agronegócio, muitos produtores rurais não conseguiram plantar devido aos custos exorbitantes de produção.
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A decisão da adoção de tais medidas não poderia ter vindo em pior momento; com o mundo saindo da pandemia de Covid-19, aliado a invasão da Ucrânia pela Rússia, muitas cadeias de produção foram quebradas, países preocupados em manter a sua segurança alimentar foram às compras, resultando, de acordo com a FAO (Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura é uma das agências das Nações Unidas) em uma inflação mundial de alimentos de 30% e drástica elevação do preço dos combustíveis.
Em outro canto do mundo, na Holanda, produtores rurais foram às ruas em protesto ao anúncio do Ministério da Natureza e da Agricultura da intenção de reduzir em até 50% a emissão de nitrogênio e amônia na produção rural até 2030. De acordo com associações de produtores daquele país, se as medidas forem implementadas, um em cada três produtores rurais do país será obrigado a abandonar a atividade.
O debate é intenso, embora o óxido nitroso, proveniente do nitrogênio, seja um dos mais importantes gases de efeito estufa, o governo alega que a motivação para a redução é a proteção de áreas naturais. Sem dúvida a Holanda deve proteger suas áreas naturais, o país produz quatro vezes mais nitrogênio do que a média da Europa devido a sua produção intensiva, mas por outro lado, a Holanda, é o segundo maior exportador agrícola do mundo depois dos Estados Unidos (27% sendo reexportação), sendo o maior exportador de carne bovina da Europa e as exportação de alimentos gerando mais de US $100 bilhões por ano em receita. Os números impressionantes e o sucesso da agropecuária da Holanda é decorrente de pesquisa e inovação tecnológica, portanto, não pode ser jogado no lixo.
Protestos se espalharam pela Europa, inspirando manifestações semelhantes na Alemanha, Polônia e Itália, atravessando o Atlântico e chegando ao Canadá. Os produtores rurais do Canadá estão preocupados com a política de redução de emissões proposta pelo primeiro-ministro Justin Trudeau de redução de 30% nas emissões de fertilizantes no país, provocando intensa reação de agricultores e ministros da agricultura, que argumentam que a meta estabelecida diminuirá a produção agrícola, aumentará os preços e custará ao país, bilhões em receita perdida.
E como fica o Brasil diante deste panorama? Não podemos minimizar os desafios na Amazônia, conflitos fundiários, extração ilegal de recursos naturais, insegurança jurídica e principalmente o desmatamento ilegal, mas é fundamental separar a agropecuária sustentável, que é a maioria esmagadora dos produtores rurais, de práticas criminosas.
O Brasil não tem outro concorrente no mundo quando se fala em agricultura que alia preservação e sustentabilidade, nossa produção agropecuária vem crescendo lastreada em pesquisa para aumento de produtividade sem o aumento de área desenvolvendo soluções como plantio direto, recuperação de pastagens degradadas, tratamento de dejetos animais, sistemas de integração, florestas plantadas e bioinsumos, que vem de encontro a uma agropecuária mais produtiva e eficiente.
A produção de alimentos no mundo passa por um momento delicado, mesmo em países auto suficientes como o Brasil, existe fome, devemos nos questionar se seria o melhor momento para adotarmos o radicalismo ambiental, que causaria desemprego, queda de renda e quebra de cadeias alimentares, ou abraçarmos práticas sustentáveis que preservam a natureza, diminuindo o impacto sobre o clima, enquanto produzimos alimentos a preços competitivos.
*Helen Jacintho é engenheira de alimentos por formação e trabalha há mais de 15 anos na Fazenda Continental, na Fazenda Regalito e no setor de seleção genética na Brahmânia Continental. Fez Business for Entrepreneurs na Universidade do Colorado e é juíza de morfologia pela ABCZ. Também estudou marketing e carreira no agronegócio.
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