A iminente aprovação da emenda constitucional para turbinar benefícios sociais neste ano com gastos fora do teto pressiona a demanda do consumidor no país, reforçando apostas em uma atuação mais dura do Banco Central para domar a inflação, avaliam analistas de mercado ouvidos pela Reuters.
Enquanto alguns economistas apontam que a PEC dos Benefícios deverá ser chave para levar a autoridade monetária a intensificar o aumento na taxa básica de juros, outros ponderam que fatores adicionais já vinham ajudando a consolidar apostas nesse sentido, como a reação mais forte da atividade e do mercado de trabalho.
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Depois de levar a taxa básica a 13,25% em junho ante mínima recorde de 2% em março do ano passado, o BC havia sinalizado a intenção de mais uma vez subir os juros na reunião de agosto, sem explicitar se seria ou não seu ajuste final.
Com a PEC na mesa e a economia mais forte, três dos quatro economistas ouvidos pela Reuters esperam que o encerramento do ciclo de aperto fique para setembro, apesar de o presidente do BC, Roberto Campos Neto, ter dito recentemente que boa parte do trabalho em relação aos juros já teria sido feito. O quarto consultado ainda vê o fim do ciclo em agosto, mas espera uma Selic alta por período mais longo diante do novo cenário.
Originalmente, a proposta previa o repasse de quase R$ 30 bilhões a Estados que zerassem o ICMS de combustíveis, mas o governo mudou de ideia, desistiu desse plano e passou a apoiar um pacote de aproximadamente R$ 40 bilhões, válido até dezembro, com repasses sociais diretos.
“O governo mudou a estratégia e resolveu focar na demanda, com mais dinheiro na mão da população, o que significará uma continuidade das pressões inflacionárias”, disse o economista-chefe da Suno Research, Gustavo Sung.
A PEC aprovada pelo Senado e agora analisada pela Câmara amplia o vale-gás, cria um auxílio caminhoneiro de R$ 1.000,00, aumenta o Auxílio Brasil em 50% e repassa pagamento a taxistas.
Sung avaliou que a mudança mais sensível no novo plano em análise pelo Congresso diz respeito ao atropelo ao teto de gastos e à legislação eleitoral, que impede a criação de benefícios no ano do pleito. Para ele, o aumento de incertezas e do risco fiscal desvaloriza o real e gera pressão adicional aos preços no país.
“Mercado de trabalho melhor, desvalorização cambial, aumento de risco fiscal e expectativa da inflação maior geram um ambiente no qual o BC terá que ser um pouco mais tempestivo, elevar mais a taxa de juros ou mantê-la alta por mais tempo”, acrescentou.
Reagindo aos temores de recessão global e ao menor controle fiscal no país, o dólar já era negociado acima de R$ 5,40 nesta quarta-feira, ante R$ 4,79 há apenas um mês.
Copom pressionado
O economista Silvio Campos Neto, sócio da Tendências Consultoria, reconheceu que a reorientação da PEC dá impulso à demanda e acrescentou que, corroborando o quadro de pressões inflacionárias, números melhores que o esperado no mercado de trabalho podem dar gás adicional para a inflação de serviços.
“Achamos que vai ser uma decisão de 50 pontos base em agosto e, indo um pouco mais além, mais uma alta de 25 pontos base em setembro, indo até 14%”, disse ele.
Economista-chefe do banco Fator, José Francisco Gonçalves já via a Selic chegando a 14% no encerramento do ciclo antes das mudanças na PEC. Agora, diz ele, o BC pode usar a proposta como justificativa para o prolongamento do aperto.
Gonçalves ponderou, por outro lado, que nem todo o dinheiro injetado na economia será necessariamente revertido em consumo, podendo ser usado para pagar dívidas ou para formação de poupança em meio a um ambiente marcado por incertezas.
Os benefícios do pacote serão pagos por fora do teto de gastos, o que, para o economista-chefe da Genial Investimentos, José Márcio Camargo, fragiliza ainda mais o arcabouço fiscal, aumentando o prêmio de risco do país e pressionando a inflação.
“Se você transfere dinheiro diretamente às famílias em vez de compensar os Estados pelo corte do ICMS, provavelmente vai ter um aumento maior de demanda”, avaliou, prevendo o fim do ciclo de aperto na reunião de agosto, mas com manutenção da Selic em patamar elevado por mais tempo.
As incertezas também estão na ponta dos riscos baixistas para a inflação, ressaltaram Camargo e Neto, diante dos temores crescentes de recessão global e eventual redução das cotações de commodities, cuja alta explosiva foi determinante para alimentar o avanço dos preços ao consumidor.
Em suas comunicações mais recentes, a autoridade monetária destacou que a incerteza sobre o futuro do arcabouço fiscal e políticas que impliquem sustentação da demanda agregada representavam risco de alta para a inflação.
Em cálculos que consideravam a zeragem emergencial de ICMS sobre combustíveis que constava inicialmente na PEC, e não o pagamento de benefícios diretos à população, o BC havia dito que os cortes tributários reduziriam sensivelmente a inflação deste ano e elevariam, em menor magnitude, o índice em 2023.
O BC ainda não se manifestou sobre o novo formato das propostas. Procurada, a autoridade monetária não comentou.
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