No meu trabalho direcionado à formação da próxima geração de líderes da elite empresarial brasileira, esse é um tema constante: qual o dever das famílias empresárias brasileiras frente ao panorama tão desigual do nosso país? Sempre começo meu discurso aos clientes dizendo uma frase do filme Homem Aranha, quando o tio diz a Peter Parker que “with great power comes great responsibility” ou “com grandes poderes vêm grandes responsabilidades”.
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Afinal, ter acesso às melhores instituições de ensino, oportunidades incontáveis de aprendizagem, acesso à cultura, acesso ao que existe de melhor no cuidado da saúde e com recursos financeiros disponíveis, posso afirmar que as atitudes direcionadas destes jovens podem – e devem – mudar a realidade do nosso país.
É uma obrigação fazê-lo?
Não.
Mas é uma oportunidade de deixar um legado para além dos negócios, devolvendo à sociedade, partilhando conhecimento, doando seu tempo e adotando uma causa que possa fazer sentido e que traga um significado para a família. Então, seria natural dizer que é uma decisão fácil, sempre positiva: escolher a causa, reunir a família, unir forças, dedicar tempo e recursos. Uma agenda positiva quase sem nenhum contraponto. No entanto, não é simples assim.
Esse tema sempre traz alguns desconfortos, pois envolve todo o ecossistema em que a família orbita. Existe nesta decisão uma visão e posicionamento político, muitas vezes uma perspectiva religiosa, uma compreensão do papel do empresariado e sua relação com o Estado. Servirá como base de comparação com outras iniciativas, e muitas vezes enfrentará uma falta de instrumentos de mensuração que comprovem reais resultados do esforço coletivo.
Com tudo isso, sabendo que existe uma cobrança grande de ação destes jovens que querem genuinamente
transformar o mundo, este assunto nunca deve sair da mesa. Além do impacto direto à sociedade, tal pauta traz autoconhecimento e uma perspectiva de mundo mais realista – a possibilidade de uma realização pessoal muito significativa.
O “como fazer”, com toda certeza, deve ser um produto das escolhas da família. E, com a mesma certeza, em um mundo de constante debate a respeito de ESG, a necessidade de ampliação da diversidade de atores em todos os setores da sociedade. São tantas formas diretas e indiretas de impactar positivamente o ecossistema que não faz sentido não iniciar uma frente de trabalho na governança e na formação de líderes com o viés de responsabilidade social.
A responsabilidade da elite empresarial brasileira, para além da atuação direta, por meio de suas empresas, na contribuição para a redução de desigualdades, é entregar ao país sua próxima geração, primeiramente autoconsciente – o que é fundamental para qualquer líder. Ela deve ser ciente das suas inúmeras possibilidades e oportunidades; capacitada para agir de forma coletiva, colaborativa e propositiva, conectando os atores e atuando de forma ativa na transformação da realidade desigual do nosso país.
Flávia Camanho é Conselheira, mentora e coach. Especialista em desenvolvimento humano e governança familiar, fundadora do Flux Institute e professora convidada do IBGC para programas de governança e Next G.
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Coluna publicada na edição 96, de abril de 2022.
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