Quando uma organização se dá conta de que a inovação é um fator condicional para a sobrevivência de qualquer negócio nos dias atuais, o que normalmente acontece depois é uma série de investigações. Parte deste processo está relacionado ao entendimento do custo da inovação, considerando as ambições da estratégia e da urgência destas entregas.
Nem sempre a jornada de colocar novas ideias em prática (inovar) traz garantias. A inovação pode ter um retorno no investimento incerto, e quando resultados expressivos se concretizam, raramente acontecem no curto prazo, pois trata-se de um ciclo de erros e acertos. Não raro, também há uma propensão à auto-imposição de barreiras.
Neste caso, a organização justifica a inércia em inovar com a necessidade de fazer algo antes de começar: sempre é preciso fazer um curso, comprar mais um equipamento, assinar mais uma plataforma. Ainda que por vezes isso aconteça de forma inconsciente, trata-se de um movimento de comodismo. A empresa continua estagnada, muitas vezes por medo de dar o primeiro passo – e isso tem um custo alto.
Para uma inovação dar certo, os astros precisam estar alinhados em quatro frentes: pessoas, processos, tecnologia e produto, que precisa atender a uma necessidade latente de mercado. E é claro que estas frentes requerem investimentos. O problema é quando projetos nunca saem do papel por serem extremamente irrealistas em termos do custo de execução.
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É importante lembrar que a inovação com baixo investimento não é sinônimo de algo menos eficiente ou valoroso do que alternativas que são (ou parecem ser) muito mais caras. Entra aí a importância da simplicidade, que na grande maioria das vezes é a característica central dos melhores produtos e serviços.
Os primórdios do Instagram ilustram essa tese. Em sua encarnação passada, o aplicativo se chamava Burbn, e era cheio de recursos dispensáveis. Uma busca por simplicidade dos fundadores resultou em uma ferramenta simples, que transforma uma foto em uma obra de arte em alguns segundos. A simplicidade rendeu frutos: em quatro meses, o aplicativo já tinha 2 milhões de usuários, e todos conhecemos o resto da história.
Muitas vezes, a rota para a inovação sem gastar mundos e fundos também está relacionada a conseguir olhar ao redor. Entra aí a importância de considerar com cuidado os recursos que se tem, e pensar em maneiras de utilizá-los da melhor forma possível. Para fazer isso, o líder precisa estar em contato próximo com seus times, e conhecer seus talentos para conseguir orquestrar entregas inovadoras. Mas como é possível testar uma ideia e saber a sua aderência, antes de incorrer em custos de desenvolvimento e de marketing?
Um exemplo prático
Imagine que você é uma startup de conteúdo relacionado ao futebol. Você já possui uma quantidade relevante de clientes, porém está explorando alternativas para aumentar sua base. Durante uma reunião de board, diversas ideias surgem. Novas frentes podem incluir, por exemplo, o licenciamento de conteúdo relacionado a surf, ou sua empresa pode querer seguir na linha do futebol – que é seu core business – e licenciar conteúdo Europeu, entre outras ideias.
As possibilidades acima podem ser excelentes em teoria, porém, na prática, podem gerar um alto custo de licenciamento de uma linha de conteúdo sem o devido retorno. O que fazer neste cenário? Alternativas que podem ser consideradas incluem um estudo profundo de mercado, seguir desenvolvendo o core com conteúdo europeu, ou mesmo fazer um estudo de custo do licenciamento do conteúdo versus retorno. Pausa.
E se simplesmente usássemos uma estratégia de verificar a aderência de cada possível nova oferta e qual o impacto isso traria na taxa de conversão de novos assinantes? Neste cenário, você faria o seguinte: segmentaria sua base de prospects e faria uma campanha oferecendo apenas os conteúdos que a sua empresa já possui.
A seguir, você criaria um segundo segmento, similar ao anterior, e faria uma campanha oferecendo um conteúdo adicional ao que você já possui, neste caso, surf. Finalmente, você criaria um terceiro segmento, similar aos anteriores, e faria uma campanha oferecendo um conteúdo adicional ao que você já possui – neste caso, futebol europeu.
Você pode estar se perguntando: como posso oferecer algo que ainda não licenciei? A resposta é simples, porém não óbvia. O raciocínio é o seguinte: para a campanha onde o oferecido é o conteúdo que você já possui, o usuário que quiser assinar o seu serviço, irá inserir seus dados, e ao final do processo, a subscrição deste usuário será concluída imediatamente. Para as campanhas onde o conteúdo oferecido não seja ainda licenciado pela sua empresa (surf e futebol europeu), o usuário que quiser realizar a subscrição não conseguirá concluir o processo e receberia uma mensagem do tipo: “Obrigado pelo seu interesse! Em breve entraremos em contato com uma promoção especial.”
Após rodar as diferentes campanhas, você poderá avaliar a taxa de conversão de cada uma delas. Imagine que as taxas de conversão das três campanhas geraram resultados similares. A pergunta a esta altura seria: “Vale a pena investirmos em licenciamentos de conteúdos adicionais”
Neste ponto, duas possíveis respostas podem surgir. No primeiro cenário, a taxa de conversão da campanha com o conteúdo que já é licenciado pela sua empresa foi melhor que a conversão das demais campanhas. Opa! Nesse caso, vamos investir nosso dinheiro na aquisição de clientes, ao invés de novos licenciamentos de conteúdo. No segundo cenário, a taxa de conversão da campanha com o conteúdo adicional de surf foi ótima. Opa! Vamos então investir no licenciamento desse novo conteúdo.
O exemplo de estratégia traçado acima ilustra que, em tempos de incerteza, a inovação não pode amplificar a aversão a risco, e sim ser usada de forma estratégica a fim de criar diferenciais de mercado. Neste processo, o foco na simplicidade e o aproveitamento de recursos existentes podem garantir o timing para a inovação, a um custo e riscos muito mais baixos. Ter estes preceitos em mente pode ajudar muito na execução de novas ideias e criar um poderoso antídoto contra a inércia.
Marvio Portela é vice-presidente sênior para Estados Unidos, América Latina e Caribe do SAS. O executivo passou por grandes empresas como Oracle e IBM, trazendo uma vasta experiência na área de vendas e gestão de parcerias. Sua carreira no SAS teve início em 2010.
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