A mídia russa o chama de “Darth Vader”. Diplomatas americanos em Moscou se referem a ele como o “cardeal cinza do Kremlin” por causa de sua influência nos bastidores. Mas seu nome é Igor Sechin e, além de CEO da gigante estatal de petróleo Rosneft, ele é há muito considerado o “número 2” não-oficial do presidente russo, Vladimir Putin.
A lealdade inabalável de Sechin a Putin nas últimas duas décadas o tornou extremamente rico. Mas quão rico? É difícil dizer com precisão, já que a fortuna de Sechin é quase tão desconhecida quanto a de Putin. Não há nenhum rastro de seu patrimônio além das ações da Rosneft, que tem capital aberto.
No entanto, com base em registros públicos, relatórios de meios de comunicação russos e avaliações de iates fornecidas pela VesselsValue, a Forbes estima que a fortuna de Sechin vale pelo menos US$ 800 milhões (R$ 4 bilhões). Ou valia isso até ele ser atingido pelas sanções da União Europeia, em 28 de fevereiro.
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Os bens mais valiosos de Sechin são dois dos iates mais caros do mundo: o Crescent, que vale US$ 511 milhões (R$ 2,5 bilhões), tem dois helipontos (incluindo um hangar retrátil), um cinema, salão de beleza e piscina. O Amore Vero (originalmente chamado St. Princess Olga, em homenagem à sua segunda esposa, Olga Sechina), vale US$ 134 milhões (R$ 670 milhões) e conta com uma piscina que se converte em um heliponto.
Em março, as duas embarcações foram apreendidas: o Crescent, na Espanha, e o Amore Vero, na França. Embora não esteja claro se Sechin é proprietário do Crescent diretamente ou por meio de um sócio, a VesselsValue aponta o russo como o proprietário beneficiário do iate, assim como uma fonte da polícia espanhola citada pela Reuters e uma pessoa ligada à indústria de iates que falou com a Forbes sob anonimato.
Sechin e seus filhos, Ivan (que foi sancionado pelos EUA em 24 de fevereiro), Inga e Varvara, também possuem imóveis no subúrbio de Rublyovka, em Moscou. De acordo com um relatório do jornal russo Vedomosti, o executivo começou a construir uma casa em um terreno de mais de 2,8 hectares em Rublyovka em 2014, e seus filhos adquiriram mais de 3,2 hectares ao lado no ano seguinte.
Os imóveis foram comprados por US$ 110 milhões (R$ 550 milhões), de acordo com o Vedomosti. Sechin processou o veículo por causa de uma reportagem de julho de 2016 que detalhou os negócios. Um tribunal russo obrigou o jornal a remover o artigo por violar a privacidade de Sechin.
O imóvel provavelmente vale mais de US$ 100 milhões (R$ 500 milhões) hoje, contabilizando as recentes quedas do rublo. Sechin também possui uma pequena participação – menos de 1% – na Rosneft que vale cerca de US$ 77 milhões (R$ 385 milhões).
Sechin se recusou a comentar para este artigo. Já a Rosneft, após receber perguntas detalhadas sobre a fortuna de Sechin, respondeu que o assunto não exigia comentários, “assim como os delírios de um louco não exigem comentários.”
“Todo o seu conteúdo consiste em fantasias e ilusões divorciadas umas das outras, fora de contato com a realidade, bem como suposições selvagens, unidas por um ódio maníaco”, disse a empresa sobre a Forbes. “Os autores claramente sofrem de uma variedade de fobias há muito tempo”.
Como Sechin ficou tão rico? Uma teoria é que ele tem desviado os consideráveis fluxos de caixa da Rosneft: a empresa, que é a segunda maior produtora de petróleo do mundo, teve mais de US$ 20 bilhões (R$ 100 bilhões) em caixa líquido em 2020 e US$ 12 bilhões (R$ 60 bilhões) em 2021.
“[Sechin] tem efetivamente controlado os fluxos de recursos da Rosneft há cerca de 20 anos”, diz Vladimir Milov, um político da oposição e economista russo que atuou como vice-ministro de Energia do país em 2002. “A Rosneft é de longe a maior geradora de dinheiro na Rússia. Quando você tem condições de determinar para onde vai esse dinheiro, você pode direcionar certos fluxos de capitais nesta ou naquela direção.”
Outra teoria é que Sechin recebe uma parte dos lucros das redes de comércio de energia da Rosneft, que intermediam a venda e o transporte de petróleo internacionalmente. “A Rosneft está fortemente envolvida em redes de comércio internacional. É uma maneira relativamente fácil de [Sechin] se envolver para enriquecimento pessoal”, diz Milov.
“Tenho certeza de que todos que participam de negócios lucrativos com a Rosneft devem ser obrigados a desviar uma certa porcentagem de seus ganhos”, afirma o economista.
“Há quatro maneiras de ganhar dinheiro [como oligarca]”, diz Anders Åslund, um economista sueco que aconselhou Boris Yeltsin sobre reformas de mercado, junto com Jeffrey Sachs, no início dos anos 1990.
“Uma é o confisco de ativos. A mais comum é receber propinas em troca de contratos públicos. A terceira é a manipulação de ações, e a quarta é contratar empréstimos e não pagá-los. O caso de Sechin provavelmente envolve um pouco dos quatro.”
Ao contrário dos oligarcas que eram amigos de longa data de Putin – como seu ex-parceiro de judô Arkady Rotenberg e o magnata da mídia Yuri Kovalchuk – Sechin não parece ter sido recompensado com uma participação significativa em nenhuma empresa. “Sechin é um servo de Putin”, diz Åslund.
Isso se reflete em sua pequena participação na Rosneft. “Ele se comporta menos como um oligarca moderno, que enriquece a si mesmo e estabelece o controle sobre ativos, e mais como um ditador soviético do passado, que simplesmente usa coisas que pertencem à empresa para suas necessidades pessoais”, diz Milov.
A ascensão de Sechin começou em São Petersburgo, onde ele e Putin nasceram e cresceram. Em 1984, ele obteve um diploma de licenciatura em francês e português da Universidade Estadual de Leningrado, onde ele também concluiu um PhD em economia.
Mais tarde trabalhou como intérprete soviético em Angola e Moçambique durante as guerras civis da década de 1980.
Sechin então retornou à Rússia para servir como consultor de comércio exterior para o governo municipal de São Petersburgo em 1988. Ele foi contemporâneo de Putin no governo local – o futuro presidente da Rússia começou a trabalhar como consultor de assuntos internacionais do prefeito Anatoly Sobchak em 1991.
Putin foi subindo na carreira, assim como Sechin: ambos se mudaram para Moscou em 1996 para trabalhar no escritório do então presidente Boris Yeltsin. No final dos anos 1990, enquanto Putin era diretor do Serviço Federal de Segurança – órgão que substituiu a KGB – Sechin ocupou vários cargos de alto escalão no governo Yeltsin. Quando Putin assumiu como presidente interino em 1999, ele nomeou Sechin seu vice-chefe de seu governo.
“Enquanto Putin subia de cargo em cargo, Sechin sempre esteve próximo”, diz Thane Gustafson, professor de direito na Universidade Georgetown e especialista em energia russa. “Ele sempre esteve vigiando a entrada do escritório [de Putin], gerenciando a vida de Putin.”
Sechin entrou no cenário dos negócios em fevereiro de 2003, quando se associou ao presidente da Rosneft à época, Sergey Bogdanchikov, em um negócio de US$ 623 milhões (R$ 3,1 bilhões) para adquirir a Severnaya Neft, uma empresa petrolífera com campos de exploração no norte da Rússia.
Foi um movimento incomum para a estatal Rosneft. A companhia acabou com ativos de baixa qualidade depois que os melhores campos petrolíferos da Rússia foram arrebatados por oligarcas na década de 1990. A aquisição de Sechin e Bogdanchikov marcou a primeira vez que uma empresa estatal russa adquiriu uma empresa privada.
“Esta foi a primeira vez que Sechin realmente apareceu no palco. Antes disso, ele era um tecnocrata bastante maleável”, diz Milov. “Sua ascensão foi muito repentina e absolutamente inesperada.”
Em uma reunião televisionada com Putin no mesmo mês, o magnata do petróleo Mikhail Khodorkovsky – então o homem mais rico da Rússia, com patrimônio de US$ 15 bilhões (R$ 75 bilhões) – discutiu publicamente com o presidente, acusou o Kremlin de corrupção e manifestou seu descontentamento com o negócio da Severnaya Neft.
Sete meses depois, Khodorkovsky foi preso sob acusações de fraude e evasão fiscal que o fizeram perder o controle de sua empresa petrolífera, a Yukos, que era então uma das maiores produtoras de petróleo do mundo. Ele foi condenado e passou uma década na prisão antes de ser libertado em 2013.
Sechin foi nomeado presidente do conselho da Rosneft em julho daquele ano, um cargo que ele acumulou com o de vice-chefe de gabinete de Putin.
Com Khodorkovsky na prisão, Sechin viu espaço para agir. Em dezembro de 2003, a Rosneft adquiriu a principal subsidiária da Yukos, a Yuganskneftegaz, por US$ 9,4 bilhões (R$ 47 bilhões) – aproximadamente metade do valor de mercado da companhia na época. Em 2005, a Yukos processou a Rosneft por US$ 11 bilhões (R$ 55 bilhões), mas faliu no ano seguinte. A maioria de seus ativos restantes foi comprada pela Rosneft por preços baixos em 2007.
A disputa na justiça se arrastou por uma década em sete países – incluindo EUA, Rússia e Reino Unido. A Rosneft finalmente chegou a um acordo com os acionistas da Yukos em 2015. Khodorkovsky disse ao Sunday Times em 2008 que os processos contra ele “foram organizados por Igor Sechin” como “uma desculpa para saquear a Yukos”.
Sechin tem laços estreitos com Vladimir Ustinov, o procurador-geral que orquestrou o ataque à Yukos: a filha de Sechin, Inga, é casada com o filho de Ustinov, Dmitry.
Em maio de 2012, Sechin deixou o cargo de vice-primeiro-ministro de Putin e tornou-se CEO da Rosneft. Sete meses depois, a Rosneft comprou a petrolífera russa TNK-BP por US$ 55 bilhões (R$ 275 bilhões).
O negócio rendeu grandes pagamentos para pelo menos meia dúzia de oligarcas que eram investidores na TNK-BP, incluindo Mikhail Fridman, Viktor Vekselberg e Leonard Blavatnik. A BP também ficou com uma participação de 19,75% na Rosneft, que possui até hoje, embora a empresa tenha anunciado em 27 de fevereiro que vai “deixar sua participação acionária”. (Potenciais compradores incluem companhias petrolíferas estatais da China, Índia e Qatar – e até a própria Rosneft.)
À medida que os ativos da Rosneft cresciam, também crescia a capacidade da Sechin de gastar muito. Em 2012, ele comprou o St. Princess Olga (renomeado Amore Vero, ou “amor verdadeiro”, depois que Sechin se divorciou de Olga), que foi entregue em 2013. Ele comprou o Crescent no mesmo ano, mas o enorme superiate levou cinco anos para ser construído. Em 2014 e 2015, ele gastou US$ 110 milhões (R$ 550 milhões) em sua propriedade fora de Moscou.
Sechin certamente não ganhou dinheiro suficiente com seu trabalho para bancar essas compras luxuosas. Ele recebeu cerca de US$ 50 milhões (R$ 250 milhões) em 2013, tornando-se o CEO mais bem pago do país, segundo a Forbes Russia. Conhecido por recorrer à Justiça, Sechin processou a revista por difamação em maio de 2014 e um tribunal russo decidiu três meses depois que o artigo deveria ser excluído porque criava uma “imagem negativa” do executivo.
A única vez em que a Rosneft divulgou publicamente a política de remuneração de Sechin foi em 2015, um mês depois que Putin disse em seu programa anual televisivo que os chefes de empresas estatais deveriam declarar seus rendimentos. Na época, a Forbes Rússia estimou que Sechin ganhou US$ 17,5 milhões (R$ 87,5 milhões) em 2014.
Houve negócios mais recentes também. A Rosneft pagou US$ 5,2 bilhões (R$ 26 bilhões) por uma participação majoritária (que pertencia ao governo russo) na produtora de petróleo Bashneft em 2016. O Kremlin havia confiscado as ações do bilionário Vladimir Yevtushenkov em outubro de 2014, depois que ele foi preso e acusado de ter lavado dinheiro quando comprou os papéis da Bashneft. (Ele foi libertado em dezembro daquele ano e as denúncias foram posteriormente arquivadas.)
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Quanto à riqueza pessoal de Sechin, ele foi sancionado pela primeira vez pelos EUA em 2014, após a anexação russa da Crimeia. Mas foi só em março de 2022, semanas depois que a União Europeia impôs sanções contra ele, que as autoridades da França e da Espanha foram atrás de seus dois superiates.
A primeira medida veio em 3 de março, quando a alfândega francesa confiscou formalmente o Amore Vero no porto de La Ciotat, na Riviera Francesa. O comunicado de imprensa anunciando a apreensão identificou Sechin como o beneficiário efetivo do iate. Duas semanas depois, em 16 de março, autoridades espanholas apreenderam o Crescent em Tarragona, cerca de 100 quilômetros ao sul de Barcelona, enquanto trabalhavam para confirmar a propriedade do iate.
A maioria dos iates de oligarcas são registrados por meio de cadeias complexas de holdings offshore, e os de Sechin não são diferentes. O proprietário do Crescent é a Densiarly Enterprises Ltd/Trident Trust Co, com sede nas Ilhas Cayman, e o Amore Vero é de propriedade da Kazimo Trade & Invest Ltd, sediada nas Ilhas Virgens Britânicas.
Ambos os navios são administrados pela Imperial Yachts, sediada em Mônaco. Uma pessoa familiarizada com o setor de iates descreveu a empresa como “o pessoal do Putin que cuida de tudo relacionado a iates”.
Um porta-voz da Imperial disse à Forbes que Sechin não é o real dono do Crescent ou do Amore Vero, mas confirmou que a empresa administra o Amore Vero desde 2018, quando foi “comprado por seu atual proprietário”. Nem a Forbes, nem a VesselsValue conseguiram encontrar qualquer evidência de que o Amore Vero foi vendido em 2018 ou que houve qualquer tipo de transferência de propriedade nesse ano.
“A Imperial é a empresa mais sigilosa do setor por causa de seus vínculos com os poderosos da Rússia”, disse a fonte da indústria de iates à Forbes. “Se você está no círculo íntimo de Putin, você compra pela Imperial.”
A Imperial também construiu o Scheherazade, de US$ 700 milhões (R$ 3,5 bilhões), que foi recentemente ligado a Vladimir Putin pela Fundação Anticorrupção do opositor Alexei Navalny. Um porta-voz da Imperial disse à Forbes que a empresa atuou como gerente de construção do Scheherazade, mas atualmente não gerencia o iate. “A Imperial Yachts não tem clientes sancionados, sejam pessoas físicas ou jurídicas”, afirmou.
Especula-se que Sechin controle ativos por meio de aliados, como o ex-CEO da Rosneft, Eduard Khudainatov. Khudainatov foi o executivo-chefe da Rosneft enquanto Sechin atuou como vice-primeiro-ministro de Putin, antes de assumir a direção da companhia em 2012.
Após um breve período como vice-presidente da Rosneft, Khudainatov deixou a estatal em 2013 para lançar sua própria empresa de petróleo, a Independent Oil Company. “Muitas pessoas consideram Khudainatov uma das ‘carteiras’ de Sechin”, diz Milov.
De acordo com a VesselsValue, Khudainatov é o proprietário do iate Amadea, avaliado em US$ 245 milhões (R$ 1,2 bilhão), registrado nas Ilhas Cayman e mantido pela Millemarin Investments Ltd. O Amadea também é administrado pela Imperial, e Khudainatov também foi ligado ao iate Scheherazade como um possível “laranja” de Putin.
O Amadea está atualmente ancorado em Lautoka, Fiji, onde vigora uma liminar que o impede de deixar o país enquanto a justiça dos EUA decide sobre um mandado de apreensão.
Embora Sechin não possa mais usar seus superiates, ele ainda é o proprietário do Crescent e do Amore Vero. “Não há uma real transferência de propriedade” quando um iate é apreendido, diz Benjamin Maltby, sócio do escritório de advocacia Keystone Law, com sede em Londres, especializado em superiates.
Apesar das sanções, Sechin parece ter encontrado uma maneira de continuar pagando pela manutenção do Amore Vero nos Estaleiros La Ciotat, onde o navio foi apreendido enquanto passava por reparos. A porta-voz da La Ciotat, Alice Boisseau, disse à Forbes que a empresa está “recebendo pagamentos como de costume” e que o iate ainda está atracado no estaleiro.
Receber pagamentos de Sechin – mesmo que sejam encaminhados por empresas offshore e terceiros – pode ser uma violação das sanções, segundo Maltby. Boisseau disse à Forbes que “os estaleiros La Ciotat cumprirão as sanções integralmente sob a supervisão da alfândega francesa”. Um porta-voz da alfândega francesa se recusou a comentar.
À medida que as sanções e apreensões se acumulam, Sechin parece ter se escondido na Rússia, longe de seus iates de luxo. Sua última aparição pública fora do país foi em um fórum econômico em Verona, na Itália, em outubro. No dia em que a Rússia invadiu a Ucrânia, ele participou de uma reunião com Putin e outros líderes empresariais russos no Kremlin.
Fora isso, ele tem sido invisível. Um jato executivo Boeing 737-700 registrado na Áustria com número de cauda OE-IRF (operado pela Rosneft e supostamente usado pelos amigos da família de Sechin para férias nas Maldivas em 2016) fez vários voos entre Moscou, Frankfurt, São Petersburgo e Dubai nos dois meses que antecederam a guerra. Seu último voo foi em 8 de fevereiro, quando foi de Moscou a Frankfurt e voltou em oito horas.
O post Qual o tamanho da fortuna de Igor Sechin, o braço direito de Putin conhecido como ‘Darth Vader do Kremlin’? apareceu primeiro em Forbes Brasil.