O ano de 2022 seguirá o mesmo ritmo de investimentos em startups que se deu em 2021. Essa é a projeção de Alex Szapiro, Head do SoftBank no Brasil. Manter “o ritmo” significa mais um ciclo movimentado do ponto de vista de aportes. No ano passado, de acordo com o Inside Venture Capital, da Distrito, foram investidos US$ 9,4 bilhões em startups brasileiras. Volume 2,5 maior que em 2020. Além disso, o Brasil também contabilizou um número expressivo de unicórnios, das empresas avaliadas em mais de US$ 1 bilhão. Mais de dez no total, e muitas delas investidas pelo SoftBank.
Em entrevista à Forbes Brasil, Szapiro comenta os impactos estruturais ao incluir startups em fase inicial no portfólio, as chamadas early stage, categoria que motivou a criação de um fundo de US$ 300 milhões pelo SoftBank, em setembro do ano passado. “A maneira de avaliar startups em fase inicial não muda. Agora, uma vez feito o investimento, a dinâmica sim é diferente. É necessário ser uma espécie de mentor, estar mais próximo no dia a dia, instruir como montar um conselho e vários outros elementos”, diz Szapiro.
As primeiras que receberam os investimentos do novo fundo, ainda em janeiro deste ano, foram Worc, Abstra e BotCity, com aportes individuais de até US$ 3 milhões, conforme adiantou o site NeoFeed. Um movimento inédito considerando que o Softbank esteve presente em grande parte dos maiores aportes do ano passado. Szapiro também fala sobre tecnologias emergentes e conceitos como metaverso e Web3, além de admitir que precisa ser feito mais em relação à diversidade e inclusão no ecossistema brasileiro.
Forbes: Quais os elementos que possibilitaram os recordes de aportes em startups no ano passado?
Alex Szapiro: São vários fatores. A indústria de Venture Capital no Brasil está cada vez mais madura. E não é algo somente de 2021, remete a 2019 quando o SoftBank chegou na região. À época, esse movimento de dar cheques maiores, o que gerou até críticas ao nosso respeito, inicialmente, contribuiu para que a indústria fosse a outro a patamar. Dar cheques maiores para ótimos empreendedores, na nossa visão, é dar a capacidade para as empresas promissoras investirem e contratarem mais talentos. Outro elemento que vimos no ano passado foi o movimento de empreendedores que já vinham de empresas com cultura empreendedora recebendo aportes. Isso é importante porque reforça o que eu falei sobre maturidade. O movimento de early stage também foi muito estratégico porque mostrou que era possível ter um número maior de startups com capacidade de empreender.
“Ninguém quer pagar mais caro, mas se está pagando 2% ou 3% a mais, não faz diferença no longo prazo. Eventualmente, pode haver correções e elas existem, mas o venture capital é uma janela de cinco a dez anos”
F: O quanto os contextos de pandemia, econômico e de digitalização contribuíram para o crescimento de startups e atração de investimentos?
AS: Foi, sem dúvida, um ano de grandes mudanças. Infelizmente, muitas trágicas, como a Covid-19. Em paralelo, ocorreu um processo de digitalização acelerada que mudou significativamente a maneira como as pessoas compram, se entretém e transacionam. Todo esse contexto, impulsionado também pela mudança no comportamento, fez com que muita gente empreendesse e outros acelerassem soluções e tecnologias que tinham correlação com essas novas dinâmicas de consumo. Também tem um outro movimento, de novas tecnologias, que afetam ao ecossistema. Sobretudo na América Latina, começamos a enxergar negócios e soluções suportados por tecnologias como blockchain, criptomoedas, Web3 e outros conceitos que fazem com que alguns segmentos ganhem novas dinâmicas, entre eles, principalmente o financeiro.
F: Muitas empresas da região ganharam destaque global, o IPO do Nubank para mencionar um exemplo, o quanto a América Latina também amadureceu do ponto de vista de talento empreendedor?
AS: A região está muito mais no mapa, do ponto de vista de talentos e também gestão. Empresas que começaram a ter seu exit e ganharam visibilidade global. O próprio Nubank, que ganhou destaque entre investidores internacionais, fundos americanos e europeus. É uma maturidade não só na capacidade de remuneração, mas também na junção de talentos que, como eu disse, formam um círculo virtuoso positivo de maturidade.
F: Ainda em 2021, a China viveu uma fase de correções nos valores investidos de entrada, como isso impactou a América Latina?
AS: É difícil julgar o que acontece na China, mas tudo que aconteceu com os investidores por lá, naturalmente, contribuí para que eles queiram diversificar. E ao diversificar, a América Latina que, de 2015 a 2017 não aparecia tanto no radar, nos anos de 2019, 2020 e 2021, passou a estar presente. Temos muitos e bons problemas para resolver e isso amplia as possibilidades de escala.
F: Falando em China, faz diferença uma startup ter um plano de expansão global para ser investida pelo SoftBank?
AS: Para nós não faz muito sentido (ter apenas empresas com potencial global no portfólio). Lógico que, se tem uma empresa extremamente inovadora resolvendo um problema que ninguém mais resolve e pode ter um alcance global, ótimo, como a Gympass, por exemplo. Ou a própria VTEX que conseguiu, ante à complexidade do Brasil, criar muito conhecimento em relação a software de logística e e-commerce. Mas várias outras empresas que investimos vão ficar só no Brasil e outras apostam na América Latina. De fato, projeção global não é uma premissa, depende de cada contexto. Inclusive, muitas vezes sentamos com um empreendedor e, ao nos deparamos com um plano de expansão fora do Brasil, perguntamos se não faz sentido olhar antes para São Paulo ou Rio de Janeiro, que já são mercados gigantes, antes de colocar esforço em uma expansão.
“A maneira como investimos e olhamos os ativos, talentos e teses é no longo prazo. Não podemos gastar energia no preço de entrada, isso pode ser um erro. Investimento é ciência. Para investir, é preciso ter métricas, padrões”
F: No ano passado, o SoftBank criou seu primeiro fundo de early stage, de US$ 300 milhões, o que muda estruturalmente ao lidar com startups em fase inicial e com perfil diferente do que vocês investiam até então?
AS: Montamos esse fundo porque o early stage demanda uma proximidade muito maior. De fato, são outras dores. Vale ressaltar que muito da lógica de investimento é a mesma, as perguntas são as mesmas. A equipe é extraordinária? O negócio é relevante? O segmento tem oportunidades? A maneira de avaliar não muda. Agora, uma vez feito o investimento, a dinâmica sim é diferente. É necessário ser uma espécie de mentor da startup. Estar mais próximo no cotidiano, instruir como montar um conselho e vários outros elementos.
F: Você mencionou tecnologias de criptomoedas, blockchain, temos também NFTs e metaverso que aparecem em alta como tendência, de que maneira esses novos conceitos, hoje, se resumem em soluções concretas para investimentos?
AS: Nós não podemos esquecer que existem muitos desafios básicos na América Latina, além de várias oportunidades ainda. Investimos recentemente na Alice, startup do setor de saúde, em um país como o Brasil em que o custo de plano de saúde é muito alto. Entre vários outros exemplos. A beleza da América Latina, do ponto de vista de oportunidades, é que tem muitas coisas que ainda podem ser resolvidas. Olhamos para todas essas tecnologias que você mencionou, mas, no final do dia, nossa tese está ligada em resolver problemas e contribuir com empreendedores que possam trazer eficiência, produtividade e melhorar a vida das pessoas. Temos várias tendências, de metaverso a Web 3.0 como já falamos, mas é importante considerar que precisamos ter o olhar de longo prazo. Eu lembro que, na época que eu trabalhei no Submarino, começo dos anos 2000, existiu um investimento enorme em fibra ótica, muitas empresas se prepararam, porém, demorou um tempo para que as pessoas utilizassem porque para fazer uso de uma infraestrutura era necessário ter devices. Com várias tecnologias acontece dessa forma, primeiro é criada a infraestrutura e depois elas escalam.
F: Fora da América Latina, o SoftBank tem o Vision Fund, voltado a tecnologias revolucionárias, ele inspira vocês na região de alguma maneira?
AS: Temos várias empresas no portfólio com essas tecnologias. A Hashdex e Mercado Bitcoin são exemplos. É sobre investir em talentos e empresas cujo core seja a tecnologia. E falar de tecnologia é algo amplo. É muito improvável que a gente invista em uma empresa de cimentos, mas se for uma startup que desenvolveu uma tecnologia que altera os átomos, aí faz sentido. Estamos sim olhando para Web3, mas com foco em usar a tecnologia para melhorar a vida das pessoas na região.
F: As fintechs se destacaram em 2021, quais outros segmentos estarão no radar do SofBank em 2022?
AS: Essa pergunta é difícil de ser respondida. Primeiro pelo fato de sermos agnósticos. Se amanhã aparecer uma empresa de turismo espacial e nós consideramos que esse é um problema a ser resolvido, fará sentido. Mas de forma prática, saúde é um segmento com muito a ser feito. Educação é outro setor importante, investimos na Descomplica, UOL Edtech, Isaac e várias outras, e esse é um ecossistema que achamos muito importante. A Unico, uma startup que mudou seu modelo de negócio, passando a focar em identidade e segurança, é outro exemplo.
F: Tem se falado de uma supervalorização de algumas startups e até mesmo um movimento de bolha, podemos estar próximos deste contexto?
AS: A melhor resposta dessa pergunta poderia ser dada em alguns anos. A maneira como investimos e olhamos os ativos, talentos e teses é no longo prazo. Não podemos gastar energia no preço de entrada, isso pode ser um erro. Investimento é ciência. Para investir, é preciso ter métricas, padrões. Ninguém quer pagar mais caro, mas se está pagando 2% ou 3% a mais não faz diferença no longo prazo. Eventualmente, pode haver correções e elas existem, mas o venture capital é uma janela de cinco a dez anos. Eu tento ignorar as correções de mercados porque continuamos a acreditar na tese de negócio relevante. Não acredito em bolha se existe visão de longo prazo.
F: Nos EUA, o SoftBank tem um fundo de US$ 100 milhões voltado a empreendedores negros, como estão as iniciativas de diversidade no Brasil?
AS: Ainda aprendemos muito com o Opportunity Fund lá fora. Não estamos prontos, ainda estamos vendo as melhores práticas e o que dá certo aqui. O tema está sendo discutido nos conselhos. Metade do problema, seja de inclusão e mesmo de ESG, é entender que ele existe e, a partir daí resolver. Acho que a velocidade que estamos neste assunto ainda é lenta. Mas nosso trabalho é começar a ajudar mais as empresas. Está na agenda, mas a velocidade de implementação ainda está aquém.
F: De forma prática, como vocês podem ajudar as empresas? Teremos algum fundo na mesma linha?
AS: Existem algumas, a maneira como se contrata é uma delas. Não olhar currículo e foto, ou mesmo evitar a contratação baseada em faculdades, por exemplo. São alguns dos exemplos de coisas que estamos discutindo com nossas startups. No caso de ter algum fundo, ainda estamos aprendendo e ainda aguardamos para conseguir ter algo de sucesso a ser replicado no Brasil e México, mas por enquanto não há nada programado neste sentido.
O post Head do SoftBank no Brasil: “Investimentos mantêm-se aquecidos em 2022” apareceu primeiro em Forbes Brasil.