Dona de um dos maiores mercados do mundo, a China é “grande demais para ser ignorada na hora de investir”, avalia Rodrigo Sgavioli, head de alocação da XP Inc. Porém, diferente do mercado norte-americano e europeu, investir na gigante asiática não é uma tarefa simples. Na verdade, ainda existem poucas opções no Brasil direcionadas para o investidor pessoa física comum.
Para os especialistas, a maneira mais intuitiva de acessar esse mercado é através de fundos de investimento ou ETFs. O XINA11, por exemplo, é um ETF listado na Bolsa de Valores de São Paulo e acompanha empresas chinesas de grande e médio porte, listadas em mercados ao redor do mundo. Na última sexta-feira (3), o papel encerrou o dia cotado a R$ 8,71.
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“É a opção mais acessível que temos para investidores comuns. Aqueles que não têm familiaridade com a Bolsa de Valores também podem comprar cotas em fundos que acompanham indexadores chineses”, orienta Sgavioli.
Entre os fundos disponíveis no Brasil, há opções que incluem as grandes empresas ou companhias voltadas para tecnologia. Porém, nenhum deles possui gestão ativa, apenas acompanham os índices já existentes.
Fundos com gestão ativa de profissionais especializados no mercado chinês estão disponíveis hoje apenas para investidores qualificados. Ou seja, profissionais do mercado financeiro ou pessoas que possuam ao menos R$ 1 milhão aplicado.
Apesar do tamanho do mercado de capitais e da variedade de opções de investimento existentes, os analistas ouvidos pela Forbes divergem sobre se este é um bom momento para apostar nas empresas do país asiático. A XP, por exemplo, tem recomendação de compra “neutro” para o país, explica Sgavioli.
O receio se baseia nas interferências estatais no mercado. “Ainda temos muita incerteza com a China. Tecnologia e edtechs, por exemplo, são setores muito impactados pela política e no curto e médio prazo podem trazer ruídos para a carteira”, afirma o head de alocação da XP.
Em setembro deste ano, por exemplo, o governo chinês limitou para três horas por semana horário permitido para menores de 18 anos consumirem jogos online. Ou seja, todas as crianças e adolescentes só poderão utilizar videogame entre 20h e 21h às sextas-feiras, sábados e domingos, além de feriados.
Antes disso, em julho, a China também limitou o lucro de empresas relacionadas à tecnologia da educação e que estavam apresentando bons desempenhos. “Com isso, o governo pode utilizar essas empresas para treinamentos estatais, sem custos competitivos”, explica Vladimir Fernandes Maciel, coordenador do Mackenzie.
Atrelada a essa limitação, em outubro, o governo do país aulas de reforço e atividades extracurriculares realizadas aos finais de semana.
Maciel explica que antes de investir é preciso entender que o mercado chinês não é como os outros. “Não há liberdade econômica. O preço dos ativos não refletem o real custo de oportunidade das empresas”, diz o professor, que alerta que o investidor “não pode se empolgar, precisa ter clareza dos riscos”.
Um exemplo da falta de liberdade econômica aconteceu na última semana, quando a Didi, empresa conhecida como “o uber chinês”, deixou de ser negociada na Nasdaq após pressão do governo chinês. Na última sexta-feira, a empresa transferiu suas ações para a Bolsa de Hong Kong.
“Grandes empresas chinesas tendem a crescer até um determinado ponto, que é quando o governo passa a enxergá-las como um risco político. Vale a pena investir desde que não comprometa uma boa parte da carteira”, orienta Maciel.
Escolher os setores também é tarefa essencial para aqueles que querem entrar no mercado. A construção civil era vista como bastante promissora, por exemplo. Porém, após a crise da Evergrande neste ano, a grande maioria dos analistas avalia que o mercado deve demorar para se recuperar.
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Setores tradicionais, como manufatura, indústria têxtil e de carvão, também são desaconselhados pelo professor. Ele explica que esses segmentos possuem baixa intensidade tecnológica e a China tem priorizado a produção de bens de maior valor agregado.
Outro ponto a ser considerado é o objetivo do país em se tornar pioneiro em energia limpa. “A China está investindo com força em eletro mobilidade individual e coletiva, energia solar, e empresas de sustentabilidade”, diz.
Esse movimento não necessariamente é positivo para os investidores. No primeiro semestre de 2021, a China anunciou seu 14° plano quinquenal, para entre 2021 e 2025, que prevê fortalecer os controles sob preços de minério de ferro, cobre, milho e outras commodities. Assim como limitação nas produções de carvão e monitoramento dos preços de petróleo, gás e soja.
O país também vai reforçar o monitoramento e as análises sobre preços de commodities como petróleo, gás e soja, afirmou a Comissão Nacional de Desenvolvimento e Reforma (NDRC) em comunicado. Este movimento fez com o minério negociado à vista no porto de Qingdao caísse 18% em uma semana e ações da Vale em quase 4% em um dia.
Um levantamento realizado pela Stake, plataforma que conecta investidores internacionais com o mercado de ações dos Estados Unidos, revela que as ações chinesas mais negociadas são as que têm recebido maior pressão por parte das autoridades chinesas.
O e-commerce Alibaba (BABA), a plataforma de transporte DiDi Global (DIDI) e o aplicativo Baidu Inc (BIDU) fazem parte desse grupo. A popularidade desses papéis é explicada em parte pelo fato de estarem listados na Nasdaq, o que facilita o acesso dos investidores.
Rodrigo Lima, analista de investimentos da Stake, avalia que as três empresas são encaradas pelo governo chinês como fonte de pouco retorno para a sociedade. “Essas Big Techs podem adquirir poder exagerado que nenhum país gosta. A diferença é que na China há interferência política e no mundo ocidental isso não é tão comum”, diz.
Para o especialista, o que justifica a alta negociação de papéis é a crença do investidor de que o preço dessas ações estão abaixo de seu real valor. “Se o investidor tem firmeza em sua tese, pode ser uma boa oportunidade de compra”, diz Lima.
As três ações são também as que apresentaram maior queda no ano. Os papéis da Didi caíram 49,64%, os da Alibaba, 42,70%, e os da Baidu, 29,22%. A insegurança dos investidores causada pelas interferências políticas são a principal justificativa dessas variações. “Acredito que muitos investidores já tenham saído dos papéis, o que também aumenta [o volume de] negociações. Uma queda de 50% é uma perda muito expressiva”, explica Lima.
Por outro lado, as empresas NIO Inc (NIO) e Xpeng Inc (XPEV) também aparecem entre as mais negociadas, e ocupam um papel importante na estratégia do governo chinês: ambas trabalham com veículos elétricos. Os papéis da NIO tiveram queda de 17,95% no ano e, os da Xpeng, alta de 19,33%.
“São boas empresas, mas pode haver predileção no mercado por outras companhias do setor que também atuam na própria China, como a Tesla, que transformou carros elétricos em equipamentos de luxo”, avalia.
Guilherme Zanin, analista da Avenue Securities, ressalta que apesar das ações da Alibaba terem caído quase 50%, o crescimento da empresa foi acima do esperado pelo mercado. “Há uma diferença gigante entre o retorno e o resultado. Isso acontece porque são empresas com bons balanços, mas que não conquistam a confiança do investidor”, diz.
No caso da Didi, em que foi necessário retirar as negociações dos Estados Unidos por causa da repressão governamental, Zanin aponta que “nunca tinha visto uma intervenção tão forte no mercado financeiro”.
Para os investidores que já investem no mercado norte-americano e querem acessar também o chinês, o analista da Avenue cita alguns ETFs listados na Nasdaq. O MCHI, por exemplo, engloba as maiores empresas do país; o CXSE inclui as empresas nas quais Estado Chinês não tem participação; e o CQQQ tem empresas chinesas associadas a tecnologia e internet.
“A China foi um motor de crescimento global e vai seguir relevante para os próximos 10 e 20 anos. Em 2028, deve ter a maior economia do mundo. Por isso, não pode ser rejeitada das carteiras”, diz. Zanin sugere que os investidores depositem entre 5% e 10% de seus aportes no país asiático, a depender do apetite de risco.
Vale ressaltar que no Brasil não há empresas chinesas listadas diretamente na Bolsa de Valores, nem negociação direta de ADRs.
Essa ausência de acesso direto faz com que o investimento no mercado seja desconhecido. Andrew Reider, CEO da gestora de patrimônios WHG, explica que abrir uma conta em uma instituição financeira da China é uma tarefa complexa.
“O investidor pessoa física não consegue comprar uma ação diretamente de Hong Kong. O investidor institucional precisa abrir conta em bancos que tenham licenças locais para operar na China e, então, investir através deles”, explica.
Na hora de escolher os papéis, Reider recomenda aqueles relacionados com energia renovável, carros elétricos, baterias, painéis solares, indústria eólica, semicondutores e inteligência artificial.
No entanto, a principal orientação do especialista é investir no mercado de renda fixa chinês, também através de fundos. “A renda fixa é muito diferente do resto do mundo, porque enquanto todos estão com juros reais negativos, incluindo o Brasil, a China segue com juros real positivo e opera muito bem em momentos de risco”, diz.
Vale ressaltar que todos os títulos de renda fixa chineses são emitidos pelo Estado – ou seja, têm risco soberano. “Este ano foi o teste perfeito. Houve problemas com a Evergrande, ruídos dentro do Partido Comunista Chinês, pandemia e mesmo assim a China deve diminuir os juros enquanto o resto do mundo aumenta”, explica.
“Uma estratégia de proteção de carteira interessante é comprar ações dos Estados Unidos e renda fixa chinesa”, diz Reider.
Para Sgavioli, da XP Inc, a China muitas vezes é vista com curiosidade pelo investidor, mas antes de comprar papéis ou cotas é importante ter em mente o retorno ao longo prazo e respeitar o apetite de risco.
“O país tende a se tornar a maior potência do mundo, mas também é muito imprevisível”, diz. Uma alternativa para investir no país e mitigar os riscos é optar por ETFs e fundos que incluam empresas globais. “Assim, há China no portfólio, mas também há Estados Unidos, Europa e mercados mais previsíveis”, conclui Sgavioli.
O post O que você precisa saber antes de investir na China apareceu primeiro em Forbes Brasil.