O CEO da Binance, Changpeng Zhao (também conhecido como CZ), comanda a maior exchange de criptomoedas do mundo. Com fortuna avaliada em US$ 1,9 bilhão, ele ocupa o 5º lugar da lista de maiores bilionários de criptoativos da Forbes e é um dos nomes mais influentes desse mercado.
Ele também é uma figura controversa principalmente por causa da postura anti-regulação da Binance. Durante anos, CZ afirmou que a Binance não tinha sede, um aceno à natureza descentralizada do bitcoin. No entanto, à medida que a indústria cresceu e passou a atrair cada vez mais atenção das autoridades, CZ começou a mudar o tom e a apoiar a regulamentação do setor. Resta saber se essa estratégia será bem sucedida.
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Muito já foi escrito sobre a história de CZ e da Binance, mas perdida em meio a essas narrativas está a história de uma organização de criptomoedas profundamente integrada, lucrativa e crucial para o setor.
Conversei com CZ para descobrir o que os investidores ao redor do mundo devem saber sobre o modelo de negócios da Binance, os fluxos de negociação e atividades da plataforma, como os mercados asiáticos diferem do resto do mundo e como o modelo operacional da empresa mudará depois que o mercado de cripto for regulado.
Forbes: Uma coisa que acho muito interessante sobre a Binance é que, de certa forma, vocês forçaram a Coinbase a mudar de estratégia alguns anos atrás. A Coinbase estava focada em clientes institucionais. Então vocês surgiram, listaram centenas de tokens e a Coinbase teve que voltar a se concentrar no investidor de varejo porque estava preocupada em perder essa participação no mercado. O que você pensa sobre isso?
CZ: Não foi planejado. O que você disse pode ou não ser verdade. Para ser franco, poderíamos ver as coisas dessa forma e a maioria das pessoas pode concordar com essa visão. Mas nós realmente não pensamos muito na Coinbase. Quando começamos, havia poucas exchanges com foco internacional. A Coinbase e a Kraken estavam focadas no mercado dos EUA. A Poloniex e a Bittrex, que eram as maiores exchanges da época, tinham volume de negócios maior do que o da Coinbase. Okcoin e Huobi estavam focadas na China. E, embora tenham uma interface bilíngue, com inglês e chinês, a forma como executam as operações é bastante chinesa. Há várias exchanges no Japão e elas se concentram no mercado japonês.
Esses são os maiores países, as maiores economias. Mas vimos que não havia ninguém atendendo 80% do mercado, que fica fora desses países. O site da Coinbase era apenas em inglês. Tínhamos suporte para quatro idiomas no dia do lançamento e nove idiomas em um mês. Hoje, oferecemos nossas interfaces em 31 idiomas. Nosso atendimento ao cliente está disponível em 16 línguas diferentes. Ainda hoje, outras exchanges têm atendimento em apenas um idioma; elas são muito voltadas para países específicos. Por isso acho que listar um grande número de tokens foi uma vantagem, mas ser mais internacional foi a primeira coisa que fizemos.
Existem muitas outras coisas. Por exemplo, no lado de produtos, quando você negociava na maioria dos sites, tinha que rolar para cima para ver o gráfico e para baixo para comprar – algo nada intuitivo. Vimos que não era assim que a plataforma deveria funcionar. Então criamos uma interface de negociação de tela cheia, na verdade duas versões dessa interface. Ambas foram amplamente copiadas pela concorrência. Posso listar várias decisões [que tomamos]. Não é apenas uma questão do número de criptomoedas disponíveis na exchange.
Forbes: Uma das razões pelas quais queria falar com você é porque quero que os leitores tenham uma ideia mais clara sobre o mercado asiático de criptoativos. Em muitos aspectos, é o maior mercado, mas é uma caixa preta para muitas pessoas que não têm tempo para ler Twitter, Discord, etc. O que você acha que um investidor estrangeiro precisa saber sobre como o trading é feito na Ásia?
CZ: A China é um mercado mais especulativo, e essa não é uma boa forma de faze trading. Na verdade, a China tem muitos investidores novatos que realmente não têm muito conhecimento.
Forbes: Isso é uma característica dos mercados de capitais restritivos, o fato de eles não terem muitas outras opções de investimentos? Por que você acha que esses investidores são assim?
CZ: Não sei exatamente o por quê. Há muito dinheiro fluindo na China. Nas últimas décadas, o crescimento econômico foi tremendo. Há muitas pessoas ricas e não há um mercado institucional na China porque os chineses não confiam em outras pessoas para administrar seu dinheiro. Até mesmo os bilionários fazem seus próprios investimentos em aplicativos em seus celulares.
Forbes: Ou eles investem no mercado imobiliário, o que é uma das razões para a Evergrande ter se tornado um problema tão grande?
CZ: Mesmo o mercado de ações da China sempre foi altamente especulativo. As pessoas seguem outras pessoas, elas próprias não fazem tanta pesquisa sobre os fundamentos de seus investimentos. E outras aplicações das criptomoedas não cresceram muito na China – como pagamentos, que foram proibidos em 2013. A China é mais especulativa nesse sentido. Para ser justo, existem grupos que estão desenvolvendo os fundamentos do blockchain. Isso acontece, mas em uma proporção bem menor do que vemos nos EUA. O Japão tem um mercado diferente. A Coreia do Sul é extremamente ativa na negociação de criptos. No restante do Sudeste Asiático, há populações maiores, mas a riqueza per capita é menor. As pessoas têm investimentos menores, mas o número de usuários é muito alto. Mas estou generalizando, as coisas podem não ser exatamente assim.
Forbes: E a intercalagem entre os horários de negociação da Ásia e dos EUA? Falando sobre ações meme, às vezes as pessoas compram coisas porque são divertidas, não por causa dos fundamentos por trás delas. Por ser um mercado global ativo 24 horas por dia, 365 dias por ano, há ramificações nos EUA e em outros lugares. O que você pensa sobre o impacto dessa dinâmica?
CZ: Acho que é impossível ter uma fórmula. Não há nada que seja tão distinto na Ásia que faça que investidor norte-americano negociar de um jeito diferente do que ele normalmente negociaria, eu penso. Até agora, não vi nenhuma estratégia específica para a Ásia que garanta resultados. Existem especuladores na Ásia e na América do Norte. Existem investidores de longo prazo em ambas as regiões. Às vezes, os mercados asiáticos sobem ou caem mais, e às vezes é o contrário, então não há um padrão claro. E porque é um mercado 24 horas por dia, 7 dias por semana, os investidores negociam à meia-noite também.
Forbes: Vamos falar sobre o modelo de negócios da Binance. Você poderia explicar os diferentes tipos de produtos que a exchange oferece? Sei que há uma grande variedade.
CZ: A Binance hoje é um ecossistema de projetos. A maioria das pessoas vê a Binance como uma exchange, mas provavelmente não conhece os outros produtos que temos. Somos de longe a maior exchange de criptomoedas. Em termos de volume de negócios, tanto à vista quanto futuros, temos as maiores participações no mercado. Em geral, somos 10 vezes maiores do que os concorrentes que chegam ao segundo lugar. A maioria das pessoas não sabe, mas temos a maior operação de conversão de moedas “fiat” (fiduciárias) em criptomoedas. Trabalhamos com 50 moedas fiduciárias de todo o mundo; ninguém tem essa cobertura. Além disso, também somos um dos maiores mercados peer-to-peer. Normalmente, em lugares onde os bancos não querem trabalhar com exchanges de criptomoedas, as pessoas negociam peer-to-peer e as criptomoedas são depositadas em nossa plataforma. A exchange Local Bitcoins normalmente é vista como a líder nesse segmento, mas somos um pouco maiores do que eles.
Temos um aplicativo de carteira de criptomoedas mais baixado, a Trust Wallet. Adquirimos 100% da Trust Wallet três anos atrás. Eles tinham um produto muito bom e uma pequena participação no mercado, mas agora são a carteira mais utilizada em smartphones. Também possuímos um dos sites de cripto mais visitados, o CoinMarketCap. Também temos, eu acho, o segundo maior mercado de NFT, que foi lançado há apenas três ou quatro meses. O OpenSea ainda é o maior; está lá há anos. O nosso está chegando perto. Também contribuímos com o BSC, Binance Smart Chain, um dos blockchains abertos mais usados. Ontem, houve 14 milhões de transações no BSC, enquanto o ethereum registrou cerca de 1,2 milhões. E se você olhar para o número de endereços ativos diários, ou o que chamamos de DA, o BSC tem cerca de 80% de participação de mercado no espaço DeFi. Outros blockchains podem ter um TVL (valor total bloqueado) maior, mas se você olhar para o número de usuários, o BSC lidera. E há muitos outros produtos que eu poderia citar.
Forbes: Vamos falar um pouco mais sobre alguns dos tokens que são oferecidos e o processo de listagem. O que você procura em um token que será listado na Binance?
CZ: O critério mais importante é o número de usuários. Se uma moeda tiver um grande número de usuários, nós a listamos. Esse é o atributo mais significativo e determinante. Considere, por exemplo, tokens meme, embora eu pessoalmente não os compreenda, se forem usados por um grande número de usuários, nós os listamos. Nós nos pautamos pela comunidade, minha opinião pessoal não importa. Existem outros fatores, como o número de endereços ativos no blockchain, quantidade de seguidores no Twitter, Telegram, tamanhos de grupos… mas o número de usuários é a métrica principal.
Forbes: Vamos falar sobre a Binance.US. Entrevistei o ex-CEO Brian Brooks algumas semanas antes de ele deixar a empresa, e a saída rápida dele surpreendeu algumas pessoas. Estou interessado na sua perspectiva sobre o que aconteceu.
CZ: Não há muito que eu possa dizer por causa de preocupações com a privacidade dos envolvidos. Mas saídas acontecem e o processo de seleção e recrutamento não garante que o candidato seja a melhor escolha possível. Então, se as pessoas entram na empresa e não se ajustam, nós mudamos a rota o mais rápido possível. Contratamos um grande número de pessoas. Ele era um dos caras mais bem cotados, mas você sabe, mudanças acontecem. Na verdade, contratamos muitos outros ex-reguladores depois disso, e a maioria deles ficou na Binance.
Forbes: O mercado dos EUA está aquecido, não só com a abertura de capital da Coinbase e a Kraken a caminho de um IPO, mas também com a FTX e a Crypto.com gastando bilhões de dólares no mercado. O que Binance.US está fazendo para competir com elas?
CZ: Nosso novo CEO, Brian Schroder, tem um plano e é responsabilidade dele executá-lo. Mas, no fundo, a prioridade são os produtos. Você tem que ter um produto e um atendimento superior. E acho que os gastos com marketing vêm em terceiro lugar. Normalmente não acredito em gastar dinheiro em marketing para ganhar participação de mercado. Não acho que seja uma abordagem duradoura e geralmente não funciona bem. Minha recomendação a eles é oferecer o produto e serviço certos e a participação no mercado virá naturalmente.
Forbes: Vamos finalizar falando sobre regulamentação. Depois de alegar não ter sede, você realmente mudou de posicionamento e começou a apoiar a regulamentação do mercado de criptos. Como estão essas discussões? Onde ficará a sede da Binance no futuro?
CZ: A maioria dos debates são muito construtivos e muito positivos. Do nosso lado, temos sido extremamente colaborativos, somos extremamente abertos e fizemos várias mudanças em nossa abordagem. O primeiro passo é que estamos passando de uma estrutura descentralizada para uma estrutura centralizada, com a qual os reguladores estão muito mais confortáveis. Para ser uma empresa regulamentada, você não pode ter uma estrutura descentralizada. Quando os reguladores perguntam a você, onde fica sua sede? Antes, nossa resposta era que não tínhamos uma, o que em geral não dá certo. Então registramos uma empresa para ser nossa sede global, e temos escritórios abertos em vários lugares, com estruturas próprias e governança.
Tudo isso já está funcionando e os detalhes devem ser divulgados mais tarde. Esse é um lado da moeda. O outro lado é que, antes, nós éramos mais reativos em relação à regulamentação. Os reguladores nos faziam perguntas e nós respondíamos. Agora temos uma atitude muito mais proativa. Vamos até eles e dizemos: ‘Podemos marcar uma reunião? Podemos entrar?’
Forbes: Obrigado pela entrevista.
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